Diário do Alentejo

“A investigação continua a fascinar-me”

02 de outubro 2022 - 11:00
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Nádia Canário tem 35 anos e é natural de Entradas, no concelho de Castro Verde. Estudou na Universidade de Évora, no curso de Psicologia, tendo em seguida ido para Lisboa, onde concluiu o Mestrado em Neuropsicologia, na Universidade Católica Portuguesa.

 

Atualmente, encontra-se  a fazer o curso de Doutoramento em Ciências da Saúde, na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e trabalha, há mais de dez anos, na área das neurociências cognitivas.  Fora do trabalho, ocupa a maior parte do meu tempo a brincar e a cuidar da sua filha, de 22 meses.

 

Recentemente, a equipa multidisciplinar de cientistas da Universidade de Coimbra e do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, da qual Nádia Canário faz parte, anunciou uma descoberta que pode vir a contribuir para o tratamento da doença de Alzheimer.

 

Texto José Serrano

 

A equipa de investigação à qual pertence anunciou recentemente a descoberta de um “hotspot triplo de patologia cerebral na doença de Alzheimer”. Como descodifica, sumariamente, a função da região cerebral identificada?

A região mencionada chama-se cíngulo posterior, a qual se constitui numa região que faz parte do córtex cerebral. É uma região complexa, que se encontra envolvida em vários processos cognitivos – como por exemplo memória e atenção – e faz parte de uma rede chamada “default mode network” (rede de modo padrão). Esta rede é composta por um conjunto de regiões cerebrais com interações entre si e que estão ativadas quando o cérebro está em repouso, quando não está a desempenhar tarefas cognitivamente muito exigentes, como se estivesse a “sonhar acordado”.

 

Que novos caminhos poderá esta descoberta iniciar no tratamento da doença de Alzheimer?

Este é um estudo importante, porque relacionou informação sobre dois marcadores biológicos da doença – a beta amiloide e a neuroinflamação – e a atividade cerebral. Por sua vez, a ideia de que, no cíngulo posterior, essa alteração na atividade cerebral está associada ao aumento da neuroinflamação na região, e não à acumulação da proteína beta amiloide, é importante, porque vem a reforçar a ideia de que neuroinflamação que existe na doença, a qual até há alguns anos atrás não era muito discutida, tem um efeito significativo no funcionamento cerebral e cognitivo. Apesar do nosso estudo não se focar na procura de um tratamento para a doença, saber a existência da relação entre neuroinflamação e atividade cerebral numa zona de alterações precoces na doença, poderá motivar novas abordagens terapêuticas, centradas no controlo da inflamação cerebral, que existe na doença de Alzheimer.

 

De que forma resumiria o seu trabalho, enquadrado na equipa multidisciplinar de investigação da qual faz parte?

Eu trabalho fundamentalmente com neuroimagem funcional, a qual permite explorar as regiões cerebrais ou redes neuronais que são recrutadas quando as pessoas realizam uma determinada atividade cognitiva – memória, atenção, perceção, funções executivas, etc.. Esta área tem grande interesse para mim, sobretudo devido à minha formação de base em neuropsicologia. Para além disso, integro também a equipa em projetos onde é necessário a realização de protocolos de avaliação neuropsicológica, onde muitas vezes participo no desenho dos mesmos e na própria aplicação. 

 

A investigação continuará a fazer parte dos seus planos?

Estou a terminar o meu doutoramento, o qual ficará concluído em 2023. Depois, conto continuar a trabalhar em investigação, área que, apesar dos seus desafios e limitações, particularmente em Portugal, continua a fascinar-me.

 

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