Diário do Alentejo

O que é que temos a ganhar com a literacia em saúde?
Opinião

O que é que temos a ganhar com a literacia em saúde?

Beja Santos, jurista

18 de dezembro 2019 - 15:40

Num tempo em que os direitos dos doentes e utentes de saúde são irrecusáveis e reconhecidos tanto pela indústria farmacêutica como pelos profissionais de saúde, que prometem tratá-los como pessoas livres e esclarecidas, compete a esses mesmos doentes e utentes de saúde agarrar com ambas as mãos dois tipos de desafios. O primeiro chama-se a boa comunicação. Sair de um consultório ou de uma farmácia sabendo como se vai tratar no quadro de uma terapêutica prolongada ou para alívio de uma chamada doença benigna, e saber como se vai tratar significa saber o que é que se vai tomar, o porquê, o como – é a boa transmissão de informação. Ambas as partes devem dotar-se de uma comunicação afetiva e efetiva.

 

O doente procurar ser claro a falar de sintomas e o profissional de saúde a saber perguntar e explicar o que fazer em exames que sirvam para um bom diagnóstico, por exemplo. E para se chegar à boa comunicação, o cidadão do nosso tempo tem de saber elevar a literacia em saúde a um patamar de exigência, esta é determinante para a promoção da saúde, para a boa terapêutica no contexto de doença crónica, tendo sempre no horizonte uma vida com qualidade e o máximo de autonomia.

 

Literacia em saúde é uma capacidade que precisamos de desenvolver por toda a vida: para ler, compreender e lidar com a informação de saúde. Entende-se por baixa literacia em saúde a dificuldade em compreender o nosso próprio estado de saúde ou ignorar as necessidades de mudarmos comportamentos, de aderirmos a um plano de tratamentos e de autocuidados. Esta literacia em saúde visa resultados sociais da mais variada ordem, o que sobressai é procurarmos a redução da morbilidade, aderirmos a atitudes que são determinantes de saúde, quando doentes crónicos ganhar entusiasmo para participar em causas comuns.

 

A literacia em saúde é assunto de educação e cultura, pois esta capacitação de obter, processar e compreender informação básica adquire-se nos bancos de escolas, num contexto familiar, na formação permanente. E daí socorrer-se de várias estratégias: materiais educativos, envolvendo os doentes na preparação e avaliação dos materiais; verificação por parte dos profissionais (médicos, farmacêuticos, enfermeiros e paramédicos) sobre a compreensão das instruções/recomendações dadas aos doentes. Um exemplo de verificação de médico para doente: “Pode agora dizer-me pelas suas próprias palavras o que é que nós estivemos a conversar e quais foram as indicações que eu lhe dei para o seu tratamento?”. As estratégias passam pela produção de folhetos informativos e alterações de fundo no sistema educativo: inserção nos currículos do ensino universitário da comunicação com os utentes de saúde e doentes para preparar futuros profissionais para serem mais proativos e obterem a concordância dos utentes e doentes.

 

No caso da farmácia, o aconselhamento pode revelar-se crucial para entender melhor como devemos usar e até abusar do aconselhamento farmacêutico e descobrir-se, sobretudo, quando se é doente crónico, que há muito a saber e perguntar sobre medicamentos. Não se pode tomar à toa o que quer que seja para a constipação, para o nariz entupido, para a tosse, para a prisão de ventre, para a febre e dores, para o mal-estar de estômago. Há interações que devem ser prevenidas, há medicamentos para combater as dores que podem afetar terapêuticas. A tudo isto dá-se o nome de literacia a visar o bem-estar e a autonomia de quem é doente crónico ou utente. Como veremos, temos tudo a ganhar se formos exigentes na cultura do medicamento, a pensar na cidadania na saúde.

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