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Luís Godinho, jornalista

10 de novembro 2019 - 12:05

Basta ler as colunas de opinião do “Observador” para percebermos o frenesim que atingiu uma certa direita lisboeta cujo horizonte se movimenta entre os negócios da banca, as empresas do PSI 20 e os investimentos milionários feitos sob o chapéu protetor do Estado, o tal Estado que tanto dizem desprezar mas que dá sempre jeito para garantir algumas rendas. Ainda esta semana, Rui Ramos volta à carga, apelidando uma putativa regionalização como o “esquartejamento partidário do Estado”. 

 

Para certas elites, a tarefa é clara: há que evitar a todo o custo o surgimento de um movimento centrífugo que capacite as chamadas regiões “de baixa densidade” com poderes de decisão política e económica. Fazê-lo seria afastar os centros de poder do Terreiro do Paço, aproximando-os das populações. Uma maçada para aqueles que, com propriedade, se julgam os novos “donos disto tudo”. Ora, o momento para o fazer é este e apenas peca por tardio. O desejável seria um entendimento entre PS e PSD que removesse do texto constitucional os obstáculos à criação das regiões administrativas, o que até nem parece difícil, tendo em conta a posição assumida por Rui Rio, para quem “uma regionalização bem feita diminui a despesa pública”. 

 

Se este acordo não for possível, é imperativo que o PS se bata desde já no Parlamento pelo aprofundamento da descentralização na exata medida que consta do seu programa eleitoral. Isto é, propondo legislação no sentido de “consagrar a eleição democrática das direções executivas das cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), por um colégio eleitoral composto pelos membros das câmaras e das assembleias municipais (incluindo os presidentes de junta de freguesia) da respetiva área territorial, com base em listas subscritas pelo mínimo de um décimo dos eleitores, respondendo as direções executivas perante o Conselho Regional”. 

 

É também imperativo que as novas CCDR integrem os serviços desconcentrados de natureza territorial, “designadamente nas áreas da educação, saúde, cultura, ordenamento do território, conservação da natureza e florestas, formação profissional e turismo, bem como dos órgãos de gestão dos programas operacionais regionais e demais fundos de natureza territorial, sem prejuízo da descentralização de algumas destas competências para as comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas”. 

 

Repito: o ideal será a criação das regiões administrativas quanto antes. Até lá, ao menos, que as CCDR tenham (alguma) legitimidade democrática, pois só assim lhes será possível fazer-se ouvir em Lisboa. A criação de um Ministério da Coesão Territorial e de uma Secretaria de Estado para a Valorização do Interior são bons indícios de que algo poderá mesmo mudar nos próximos meses. É preciso que os representantes políticos das regiões do interior não baixem a guarda, não deixem cair esta bandeira, confrontem o Governo com o seu próprio programa eleitoral e lutem por um poder executivo mais próximo das populações. Alguém imaginaria (por absurdo) que um troço de autoestrada entre Lisboa e Loures pudesse estar pronto e encerrado durante dois anos?

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