Diário do Alentejo

Aeroporto de Beja, óbvio!
Opinião

Aeroporto de Beja, óbvio!

Fernando Caeiros e José Lopes Guerreiro

06 de outubro 2023 - 14:15

A comissão técnica independente (CTI) entregou ao Governo no início de setembro a “Análise de curto prazo da situação atual do aeroporto Humberto Delgado (AHD)”, cujas conclusões foram recentemente divulgadas. A CTI é categórica em relação à atual situação do AHD que, segundo a mesma, está claro que apresenta “ineficiência operacional e de layout que condicionam o uso da capacidade instalada e a possibilidade de uma solução de médio prazo de incremento de capacidades”. A CTI sinaliza várias ações de melhoria para o funcionamento do AHD, incluindo uma recomendação em que dá ênfase ao uso do aeroporto de Beja para voos de carga e charters, enquanto um novo aeroporto de Lisboa não existir.

A CTI também sublinha as condições de acessibilidade ao aeroporto de Beja, que, como há muito se reclama, não ajudam a sua utilização como “alternativa comercial para gestão das pontas de tráfego de passageiros do AHD e do aeroporto de Faro”. Isto é: sinaliza a ausência do prometido e tão propalado investimento na ferrovia e na rodovia, enquanto elemento que prejudica o aproveitamento das potencialidades do aeroporto de Beja, incluindo a mitigação dos constrangimentos daqueles aeroportos, sem que questione quaisquer insuficiências na infraestrutura aeroportuária alentejana, como por vezes nos pretendem vender, lamentavelmente, também por entidades locais a quem compete a defesa intransigente do óbvio.

Ao suscitar nestes termos a questão das acessibilidades, a CTI dá um enorme “puxão de orelhas técnico” aos responsáveis pelas condições de acessibilidade ao aeroporto de Beja, os tais que teimam em não “reparar”, embora possam ver o óbvio, tal como há meses insinuámos ao transcrevermos a célebre citação de Saramago “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”, em artigo publicado num órgão de comunicação nacional.

Para os que reclamavam sem sustentação e irrealisticamente a integração do aeroporto de Beja na listagem das potenciais localizações para o futuro aeroporto da capital e ficaram “desapontados” quando, justamente, a ideia não foi acolhida, poderão agora perceber quão importante é Beja enquanto infraestrutura complementar a Lisboa e a Faro – que não enquanto alternativa –, tal como reiteradamente apontamos em artigos sobre esta temática*.

Estamos em crer que se lhes juntarão outros “desapontados”, principalmente, os que na sombra dos corredores do poder ao longo de anos têm diabolizado o aeroporto alentejano e os que subrepticiamente tentam influenciar políticas públicas para salvaguarda de interesses imobiliários e outros de “fundos” sem rosto, coisa que Beja dificilmente propicia.

Este reconhecimento do papel do aeroporto de Beja permite-nos voltar a pôr em cima da mesa outras considerações oportunamente desenvolvidas, como a pertinência em antecipar as obras de acesso à autoestrada – acabando com o ridículo faseamento –, bem como a requalificação e eletrificação da linha do Alentejo, em consonância com a mais ousada proposta do Plano Ferroviário Nacional.

Por outro lado, mantém-se atual a proposta sobre a utilização do aeroporto de Beja para voos comerciais para abastecimento, de entre outras propostas sobejamente discutidas, como: o reforço das operações de manutenção de aeronaves, os voos premium e a urbanização e promoção do solo adstrito ao aeroporto com o uso autorizado para edificações industriais e de serviços.

Finalmente, reforçamos a sugestão no sentido da criação de uma entidade sem fins lucrativos, independente e sem restrições na adesão à mesma, para “desenvolvimento e promoção do aeroporto de Beja”, “envolvendo as mais proeminentes entidades públicas e privadas regionais” e particulares, que confiram conhecimento acrescentado ao projeto, para a qual há cidadãos que poderão ajudar a dar o pontapé de saída, assim as associações representativas do setor económico, do setor autárquico e a concessionária do aeroporto convirjam neste propósito. Porque não fundando uma associação com denominação que sintetize o objetivo preconizado: Aero-Pax, Promoção do Aeroporto de Beja?

Sugere-se, pois, a criação de uma associação que privilegie a colaboração entre entidades que partilhem os mesmos objetivos e tenham responsabilidades na promoção e valorização do território onde o aeroporto se inscreve, com um olhar atento às potencialidades que a infraestrutura aeroportuária encerra, ciente de que o sucesso de qualquer estratégia para o desenvolvimento e promoção do aeroporto passa também pela ação responsável, participada e agregada dos agentes mais proeminentes que atuam no território, incluindo particulares que, no quadro da intervenção cívica, se proponham aderir ao processo.* “Público”, 29 de julho de 2022; “Público” on line, maio de 2023

Fernando Caeiros foi presidente da Câmara Municipal de Castro Verde (1976-2008) e vogal executivo na Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Alentejo (2008-2012).

José Lopes Guerreiro desempenhou os cargos de vereador na Câmara Municipal de Beja, presidente da Câmara Municipal de Alvito, presidente da Associação de Municípios do Distrito de Beja e presidente da Região de Turismo Planície Dourada.

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