Diário do Alentejo

O direito do cérebro ao descanso
Opinião

O direito do cérebro ao descanso

Vítor Encarnação, professor

02 de setembro 2023 - 17:00

Há dias em que o cérebro não se dá ao trabalho de encontrar palavras para definir as coisas. É escusado pedir, não vale a pena prometer nada em troca, o cérebro não quer saber de mais nada a não ser que o deixem em paz, que o deixem de fora de qualquer equação emocional ou racional, que não o perturbem com a mais simples pergunta ou a mais óbvia conclusão. Há dias em que o cérebro apenas quer existir no corpo como uma unha, um fio de cabelo, ou como todas as outras partes do corpo incapazes de um gesto, de um pensamento, de uma atitude, de uma vontade, essas partes que ficam como as deixam e não se inquietam e não se importam de não serem mais do que aquilo que são. Há dias em que o cérebro precisa de descansar, precisa de deixar de ter ligação aos olhos, aos ouvidos, às mãos que não sossegam, às pernas que não param, aos sonhos pesados que o acordam todas as noites a más horas e não o deixam dormir como dormem os justos.

Há dias em que o cérebro quer ser uma ausência, uma falha, uma incapacidade, um esquecimento. O cérebro tem esse direito, o cérebro merece que o deixemos interromper a vertigem de pensar, de estar atento, de ser inteligente, de calcular, de tomar decisões. Há dias em que o cérebro não aguenta uma carga tão grande, uma tão árdua tarefa, não há nada que não passe por ele, tudo requer o seu aval. Há dias em que o cérebro precisa de enroscar a um cantinho da cabeça, como uma criança pequenina se enrosca no regaço da sua mãe.  

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