Diário do Alentejo

Mariana Alcoforado – Carta 3
Opinião

Mariana Alcoforado – Carta 3

Vítor Encarnação, professor

19 de agosto 2023 - 19:00

Mariana, mon amour, depois de muitas léguas, sempre que me virava, ainda via Beja. Beja não tira os olhos de nós, a planura não nos deixa fugir de Beja. A verdade é que eu estava perdido de amores por ti, mas tu e eu estávamos a criar um amor impossível, a tua família nunca permitiria a nossa felicidade. Seríamos apenas mais dois desgraçados cuja sina é morrerem um pelo outro. Como sabes, os homens são fracos, os homens têm medo do amor, o amor torna-os mais transparentes e é por isso que eles o receiam. Receiam que os vejam por dentro, que os desarmem, que lhes vejam o mundo mal resolvido.

Pareceu-me ouvir os teus gritos, já eu avistava o mar. Já no barco, já na costa da Galiza, pensei quase como o poeta haverá de pensar: Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas que eu trouxe de Portugal?! Todos estes anos tenho andado incerto, inseguro, melancólico, a conjugar a gerúndio das saudades. Já pensei em voltar, mas tenho medo. Já não da tua família, já não de ser morto por causa do amor que te tenho. Tenho medo de voltar e tu teres morrido, quem sabe se de amor se de raiva, ou de estares viva, feliz nos braços de outro homem ou nos braços de Deus para sempre, tenho medo de me teres esquecido por causa de tanto tormento em vão, de me odiares por causa de tanto amor desperdiçado, por causa da minha tirania. Digo-te agora, digo-te com todas as minhas forças e com toda a minha alma que renunciei a tudo por ti. Espero que não seja demasiado tarde.

Ton amour, Noël Bouton de Chamilly.

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