O relatório "Estado das Aves em Portugal 2019", elaborado pela SPEA, mostra que a redução do número de exemplares das espécies mais comuns não é caso isolado: "Os dados recolhidos em vários programas de monitorização convergem na conclusão de que, como consequência da intensificação da agricultura, com o investimento no regadio intensivo, nas estufas e nos agroquímicos, as aves de zonas agrícolas estão em declínio".
Considerada como uma espécie emblemática das planícies alentejanas, o sisão é também uma das aves estepárias mais "icónicas e ameaçadas" da Europa, tendo a sua população diminuído cerca de 49 por cento desde o início do século. Na verdade, enquanto o primeiro censo nacional do sisão, coordenado entre 2003 e 2006 pelo Instituto de Conservação da Natureza e da Floresta e pela SPEA, quantificou a existência de 17 419 machos reprodutores em todo o território de Portugal continental, atualmente esse número não irá além dos 8900. Sendo um decréscimo populacional muito significativo nas áreas designadas para a proteção da espécie (de 6 695 para 5 008 machos), é ainda mais substancial fora dessas áreas, com uma quebra de 64 por cento (de 10 724 para 3 892 machos), tendência registada igualmente em todo o sudoeste europeu, o que deverá levar ao agravamento do estatuto de conservação desta espécie, atualmente considerada vulnerável tanto em Portugal como em Espanha.
De acordo com a SPEA, em causa está uma "alteração significativa no uso dos solos" no Alentejo, com a conversão de vastas áreas de sequeiro em pastagens permanentes, olivais intensivos, vinhas e outras culturas. "Esta intensificação agrícola não se resume à perda de habitat, pois a sua qualidade também tem vindo a degradar-se, com maiores densidades de gado nas pastagens e o corte de vegetação (fenos) a ocorrer cada vez mais cedo coincidindo com a fase de ovos ou crias nos ninhos. Por outro lado, o uso de fitofármacos e as extensas áreas de monoculturas não promovem a ocorrência de insetos, rebentos e flores de que as crias necessitam para se alimentar", sustenta a associação ambientalista. As colisões com linhas elétricas e a caça furtiva, sobretudo, fora das áreas designadas para a proteção da espécie, são outras causas que justificam uma mortalidade elevada.
Os dados recolhidos pela SPEA permitem concluir que em Castro Verde, onde se situa a principal área de proteção da espécie, a redução do número de machos foi das mais pequenas do País, tendo passado de 3390 para 3090 (- 8,8 por cento), aqui se concentrando mais de um terço dos exemplares recenseados. Em áreas como a Zona de Proteção Especial de Mourão, Moura e Barrancos a espécie registou uma regressão de 77,3 por cento, passando de 828 para 188 machos, precisamente o contrário ao verificado no rio Guadiana (+ 73,9 por cento).