Diário do Alentejo

Um clássico alentejano, que soube reinventar-se

05 de agosto 2021 - 14:45

Texto Manuel Baiôa

 

A Herdade de Coelheiros situada na Igrejinha, concelho de Arraiolos, tem uma longa história ligada à agricultura. No entanto, foi nos anos 90 que ganhou grande notoriedade com o aparecimento do vinho Tapada de Coelheiros, que se transformou numa das grandes referências dos vinhos alentejanos devido à intuição do seu proprietário, Joaquim Silveira, e ao saber do enólogo António Saramago. Após a morte do seu proprietário, passou por uma fase de algum apagamento.

 

Em 2015 os brasileiros Alberto Weisser e Gabriela Mascioli apaixonaram-se pela riqueza e biodiversidade e adquiriram a propriedade. Alberto tem uma longa carreira de executivo em várias multinacionais. Começou pela BASF e em 1993 mudou-se para a Bunge, uma das maiores empresas mundiais de óleos alimentares e produtos agrícolas. De 1999 a 2013 passou a ser o presidente executivo desta empresa e mudou-se para Nova Iorque. Atualmente continua a ser consultor de várias empresas internacionais, mas a sua nova casa passou a ser a Herdade de Coelheiros. Gabriela Mascioli é apaixonada por gastronomia, foi curadora do evento Casa Boa Mesa e proprietária da livraria Mille Foglie, em São Paulo, especializada em gastronomia e vinhos.

 

O casal decidiu que queria ter um projeto pessoal na área agrícola e começou a ver terrenos na Europa em 2014. Depois de algumas visitas a herdades e quintas decidiram adquirir a Herdade dos Coelheiros devido ao seu ecossistema único e ao facto de já ser uma marca consolidada no mundo dos vinhos, que necessitava apenas de uma renovação para brilhar bem alto no firmamento dos vinhos portugueses.

 

Esta propriedade ainda mantém o quadro clássico das grandes herdades alentejanas, uma vez que preserva uma grande multiplicidade de culturas agrícolas nos seus 800 hectares, entre os quais 40 de pomar de nogueiras (seis por cento da produção nacional) e uma vasta área de montado (600 hectares) onde pastam livremente 1000 ovelhas, veados e gamos. A riqueza da sua biodiversidade inclui ainda uma parte de olival, barragem e outros animais como patos, lebres e coelhos.

 

As vinhas totalizam 50 hectares, divididas em nove pequenas parcelas, com partes regadas e outras de sequeiro, implantadas em solos com diferentes texturas de origem granítica. As vinhas estão misturadas de modo harmonioso com os restantes ‘habitats’ da herdade, para assim desenvolverem todo o seu potencial, facilitando a conversão para o modo de produção biológico e para uma agricultura regenerativa e sustentável. Neste momento também estão a realizar várias experiências em biodinâmico e a proceder a enxertias e replantações de castas maioritariamente portuguesas. A filosofia de Coelheiros passa pela mínima intervenção humana no “trabalho” da natureza. Desta forma, garante-se uma expressão mais natural do potencial das castas. A herdade situa-se numa latitude um pouco acima de Lisboa e numa cota acima dos 300 metros, pelo que apresenta características mais frescas do que outras zonas do Alentejo.

 

O relançamento da marca “Tapada de Coelheiros” trouxe consigo uma série de mudanças e algumas continuidades, mas mantendo a identidade da casa. Os novos vinhos têm uma nova imagem, mas a ligação ao passado mantém-se com a permanência da marca e dos rótulos ligados à arte do bordado de Arraiolos, embora numa versão mais modernista.

 

Em 2016 entrou Luís Patrão, já com larga experiência na Herdade do Esporão, para assumir a enologia, contanto com a colaboração de João Raposeira na viticultura, e de António Saramago, que ainda mantém uma ligação à empresa, fazendo a ponte entre o passado e o futuro. A aposta na excelência levou a uma redução da produção de 400 mil para 120 mil garrafas/ano, mas com um reposicionamento para um segmento alto ao nível dos preços. Portanto, com a redução das quantidades produzidas, o foco passou a estar na qualidade.

 

O número de referências também baixou significativamente, avançando-se para uma simplificação do portefólio. Na base da pirâmide temos a marca Coelheiros que é produzida com castas típicas portuguesas, num estilo regional, mas elegante, fresco e sofisticado.

 

O vinho Coelheiros branco 2019 foi elaborado com as castas Arinto (85 por cento) e Antão Vaz (15 por cento). A fermentação iniciou-se em depósitos de inox, passando posteriormente 30 por cento do lote para barricas de 500 litros, onde estagiou seis meses. O vinho é marcado pelo Arinto, num registo contido, citrino, fresco e mineral, onde se deteta alguma pólvora. A sua bela acidez permite-lhe uma grande versatilidade a nível gastronómico e bom potencial de envelhecimento. PVP: 10 euros.

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