Diário do Alentejo

À Mesa c/ António Catarino: Adega em Mourão é tradição autêntica

25 de junho 2020 - 10:00

Nestes dias em que o calor já aperta e as praias do maior lago artificial da Europa são uma refrescante e bem concebida realidade, as margens da albufeira de Alqueva ganham maior atratividade. A região é um destino privilegiado para quem gosta de saborear o lento correr do tempo e desfrutar de magníficas paisagens.

 

Na rota que se desdobra para além de Reguengos de Monsaraz e atravessa o grande rio do Sul, transformado em gigantesco espelho de água onde se reflete, altivo, qual sentinela a mirar Espanha, o velho burgo de Monsaraz, surge Mourão, na margem esquerda do Guadiana. Vila raiana, palco de pelejas históricas, foi recinto de batalhas nas guerras da sucessão de Castela e, séculos volvidos, na da Restauração.

 

Ali chegados, é boa opção demandar a Adega Velha, um verdadeiro ex-líbris gastronómico da vila. A tarefa não é difícil, tomando o jardim como ponto de referência. Mal entramos na adega, de ambiente genuíno e chão lajeado, que proporciona frescura nos dias de canícula, saltam à vista as empoeiradas telefonias, sintonizadas na tradição, que cobrem as paredes onde se encostam as bojudas talhas de barro.

 

No balcão à esquerda servem-se copinhos e não faltam pão, azeitonas, queijo e linguiça. Às duas por três, é dado o mote e lá se canta a primeira de muitas modas. É a expressão do Cante, em toda a sua força e dimensão, espontâneo e autêntico, que entoa pelas quatro salas da velha adega, onde o engenheiro Joaquim Bação, anfitrião culto e bem humorado, faz as honras da casa, promovendo o bom tinto.

 

Nas mesas entre talhas, o rol de entradas é relevante: coelho de coentrada, vulgo à S. Cristóvão, paio ou cachola assada preparam o palato para doses mais substanciais.

 

Na cozinha, localizada ao fundo da casa e onde oficiam mãos sabedoras, é preparada a opípara sopa da panela, que neste capítulo tão alentejano tem rival à altura: a sopa de cação. Especialidade é a perdiz à Adega Velha, bem como a lebre com grão e nabos, mas o cozido de grão pede meças às demais sugestões da lista, de resto, pouco extensa. Nela podem figurar lombo de porco assado com pimentão; feijão com chouriça; ovos mexidos com espargos bravos ou com cilarcas, os cogumelos desta região também conhecidos por tortulhos.

 

As sobremesas são igualmente tentadoras: bolo rançoso e encharcada completam um manjar de eleição nesta adega em que a velha tradição se mantém tão pujante, quanto autêntica. Como o Cante.

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