Diário do Alentejo

Paulo Serrão: “O futebol é uma paixão para vida

17 de fevereiro 2021 - 10:25

Texto Firmino Paixão

 

O Aljustrelense foi, digamos, o pano de fundo da sua carreira de futebolista. Chegou a Aljustrel em 1993, saiu mais adiante e fez um interessante périplo por outros clubes, voltando a vestir a camisola tricolor uma década depois, nessa altura, para uma permanência de 12 épocas durante as quais viveu momentos inesquecíveis. Hoje, com 45 anos, é o mais velho entre os quatro “quarentões” do plantel do Messejanense, treinado pelo amigo Paulo Capela, com quem, também, se sagrou campeão da II Divisão, ao serviço do Panóias.

 

Paulo Serrão nasceu em Caluquembe, na província de Huíla, em Angola, corria o mês de julho de 1975. O futebol foi sempre a sua grande paixão: “A bola de futebol acompanhou-me desde que conhecei a andar. É uma paixão para vida. Apenas praticava os outros desportos na escola, mas quando vinha para o intervalo a bola era outra vez a minha escolha”.

 

As memórias de Angola não serão muitas. “Vim para Portugal com apenas três meses de idade, por causa da guerra civil angolana. A família pensava que seria por pouco tempo mas, na verdade, nunca mais voltámos”. Uma vez por cá, e mais crescido, começou a sua aventura no futebol: “O meu primeiro clube foi a Quimigal, hoje Fabril. Depois, por influência do meu professor de educação física, Carlos Gomes, fui jogar no Palmense. Nesse ano existiu um campeonato de escolas e tive a sorte de pertencer a uma seleção de alunos que representava a minha escola. Como tinha revelado que, quando terminasse o ano letivo, iria morar para Sintra, o professor ajudou-me a ir treinar no Palmense, e por lá fiquei”.

 

A época correu bem, o Palmense jogava no Campo das Laranjeiras, na zona de Benfica e, claro, não tardou que o Paulo Serrão, quando menos esperava, vestisse de águia ao peito: “Foi um sonho de criança que se tornou realidade. Fui muito feliz no Benfica mas, entretanto, cheguei a sénior e, confesso, não tinha argumentos, nem maturidade, suficientes para representar uma equipa com a dimensão Benfica”.

 

Surgem então dois convites, um do Sintrense, outro do Aljustrelense. Paulo Serrão queria ficar perto de casa, o pai incentivou-o a descer até ao Alentejo. A proposta do Aljustrelense foi mais atrativa e, por outro lado, o pai também lhe fez ver que necessitava de ganhar asas. “O meu pai não era da opinião de eu ficar perto de casa, insistiu muito e fez-me ver outras oportunidades que iria ter e crescer como homem e começar a ser mais independente. O meu pai tinha razão. Nesse ano, em Aljustrel, tirei a carta de condução e comprei o meu primeiro carro”, lembra.

 

No final da época o Mineiro desceu da, então, III Divisão Nacional e surgiu uma proposta do Castrense, onde se manteve até ser chamado para o serviço militar, algo que o impediu de continuar em Castro Verde, mas não impediu de concluir a época no Vasco da Gama de Sines. Na seguinte voltou ao Castrense e aí surgiu aquilo que Paulo Serrão diz ter sido “uma grande oportunidade” de realizar a pré-época no Farense com o objetivo de “convencer” o treinador Paco Fortes.” Disputámos um torneio, em Setúbal, e no final, o ‘míster’ disse que tinha gostado e que contava comigo. Senti uma felicidade enorme e realizava mais um sonho, tendo a possibilidade de jogar na I Divisão, nos melhores estádios e contra as melhores equipas de Portugal”.

 

Estreou-se em outubro de 1997 no Estádio da Luz, cabendo-lhe a tarefa marcar João Vieira Pinto. “Infelizmente, perdemos por 3-1, mas os meus olhos não conseguiam esconder a emoção e a alegria por voltar a um estádio que tão bem conhecia”. Segue-se uma experiência no estrangeiro, no Nafpaktiakos Asteras, na Grécia, onde revela ter apanhado um tamanho susto: “Residia num hotel cuja lavandaria estava avariada. Então, indicaram-me outro local na cidade onde poderia lavar a roupa e eles pagavam. Como sempre fui muito arrumadinho, dobrei a roupa suja e meti-a num saco desportivo. No caminho passo por uma enorme feira e vejo alguns feirantes a fugir das autoridades… a polícia apanhou alguns e, surpresa a minha, apanhou-me também. Com a roupa tão arrumadinha no saco tive dificuldade em provar que não era feirante. E lá fui no jipe, até à esquadra, com dois feirantes turcos que vendiam relógios e roupa”.

 

O incidente resolveu-se com um telefonema para o hotel e após intervenção do presidente do clube. De regresso a Portugal rumou ao Sporting de Espinho, então na II Liga, até receber nova proposta, desta vez para jogar no Operário de Lagoa. Voltou ao território continental para representar o Imortal de Albufeira, até surgir nova proposta para regressar ao Alentejo, dessa feita, do Moura Atlético Clube e a convite de João Caçoila. Finalmente, em 2004, regressou ao Aljustrelense onde ficou por mais de 12 anos. “Foi o clube que mais gostei de representar, pelo carinho dos adeptos e, principalmente, pelo apoio das pessoas que colaboravam para que nada nos faltasse. Sinto uma enorme gratidão. Tenho a certeza que todos os treinadores que passaram pelo Mineiro sentiram o mesmo que eu”.

 

Enquanto permaneceu em Aljustrel, Paulo Serrão tirou um curso de eletricista, fez o estágio na Câmara Municipal, altura em que solicitou a transferência para Sintra.

 

Também foi treinador dos escalões de formação do Mineiro, faltando-lhe treinar uma equipa sénior, apesar de, em determinados momentos, os dirigentes do Mineiro o terem convidado para o fazer, convites que declinou. Num primeiro momento porque ainda era (e é) jogador, depois porque aguardava a sua transferência profissional para Sintra, onde reside, feliz e reconhecido por tudo o que o futebol lhe proporcionou.

 

No Alentejo, deixou raízes – os filhos, Luís, mineiro de profissão, e Gonçalo, Mineiro de formação, criado nas suas escolas, com uma passagem recente pelo juniores do Belenenses, que a pandemia abreviou, voltando à casa-mãe, para ali prosseguir a carreira.

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